"árvore"
altura 2,2 metros 
diâmetro da base 1 metro
pasta refractária 
1100ºC 


CRIAÇÃO DE UMA ESCULTURA EM CERÂMICA
Executada e queimada no local onde vai ficar implantada.


Este projecto iniciou-se acerca de 10 anos atrás resultante da vontade que eu tinha de executar um trabalho de grandes dimensões, inteira (sem ser modulada) e cuja execução esbarrava sempre na impossibilidade de ter um forno suficientemente grande para a poder queimar. Estudei então os processos que teria de enfrentar para concretizar tal escultura.
Desde logo, e como atrás referi, o forno para a queima seria o principal obstáculo, mas não o único. Uma peça desta natureza teria de ser feita e queimada necessáriamente no local onde iria ficar implantada.
Ao longo do tempo fui amadurecendo a ideia de fazer uma peça à volta da qual pudesse construir um forno de papel, igual aos que dezenas de vezes executei para queimar peças pequenas.
O meu interesse pelos fornos de papel, resultou da minha participação num workshop orientado por Aline Favre (École des Arts Décoratifs de Génève) no ARCO, na Quinta de S. Miguel em Almada acerca de 30 anos atrás. Tendo já realizado vários projectos de Forno de Papel, concretizei, em 2015, no Solar dos Zagallos, um Workshop com a Imargem (Associação dos Artistas Plásticos de Almada) com a participação de 17 pessoas.
Investiguei, a propósito, o trabalho de Nina Hole, uma ceramista Dinamarquesa que realizou, um pouco por todo o Mundo, esculturas de grandes dimensões com estas características de trabalho. No entanto, o método de queima utilizado pela Nina Hole valendo pela sua espectacularidade e pelas enormes dimensões dos objectos criados, não me garantia atingir os objectivos a que me propunha nomeadamente a temperatura de queima. 
Projectei uma escultura de média dimensão e estabeleci o objectivo de a queimar no local onde ia ser construída a uma temperatura não inferior a 1100ºC para garantir a sua integridade futura. Resolvi utilizar então os dois processos investigados. Para isso, à volta da escultura, de forma cónica, projectei construir um forno de papel e revestir esse forno com uma densa camada de manta refractária. A utilização das duas coberturas não reduziu a espectacularidade da queima, sobretudo à noite, com a magia das chamas lambendo a escultura e mudando de tonalidade desde a cor alaranjada até ao esbranquiçado sinónimo de uma temperatura elevada. Comprovada, com o auxílio de dois pirómetros electrónicos, atingimos um pico de 1128º C e mantivemos durante cerca de uma hora, a temperatura entre os 1050ºC e os 1100ºC.





Tinha surgido a hipótese de concretizar o meu projecto. Quando o apresentei à Imargem (Associação dos Artistas Plásticos de Almada), a cujos Corpos Gerentes pertencia, no âmbito da preparação do programa “Arte em Festa 2016” este foi aceite pelos meus parceiros da direcção e passou então a constar da proposta de programa do referido evento apresentada à Câmara Municipal de Almada, que o apoiou, integrado no conjunto da programação “Arte em Festa”- Imargem 2016.

Foi assim, que dando corpo ao meu projecto, um grupo de 15 participantes o executou em conjunto com grande empenho e entusiasmo, nos Jardins do Solar dos Zagallos em Almada.

Durante a construção da escultura fui introduzindo alterações ao mesmo quer na forma, quer no processo de construção. Algumas dessas alterações foram feitas de acordo e em diálogo com os participantes no workshop.


Participantes no Workshop de Escultura Cerâmica Arte em Festa 2016, no Solar dos Zagallos
Ana Gracinda Cardoso
Ana Maria Filipe
André Silva
Maria Celeste Sambrana
Maria Elisa Leite
Maria Elisabete Sousa
Maria Emília Oliveira
Maria Eugénia Botelho
Mariana Alves
Isabel Lamelas
Júlia Quaresma
Luís Tavares
Paulo Soares
Maria Rosa Alves
Victor Passos

Colaboraram também no Workshop
Aurora Bargado
Fernanda Guerreiro
Francisco Palma

Jorge Pé Curto


Dia 21 de Maio
Apresentação e explicação do Projecto aos participantes no Workshop.
Conversa sobre o trabalho das ceramistas Nina Hole (da Dinamarca) e Aline Favre (da Suíça).

Visita ao local de construção da Escultura.



Solar dos Zagallos

Apresentação do Projecto

Apresentação do Projecto






Dia 28 de Maio

Explicação de todo o processo de construção e das técnicas a usar. Discussão sobre as dúvidas surgidas. Este processo teve implicações no processo da construção levando a pequenas mas significativas alterações quer no processo de construção quer na forma da escultura.  



Visitámos o Local.



Dias 30 e 31 de Maio
Limpeza do Terreno.
Montagem do Estaleiro.
Transporte dos andaimes e dos tijolos refractários.
Recepção dos primeiros blocos da pasta refractária usada.
Início da preparação das barbotinas. 


Com o auxilio de funcionários da CMA preparou-se o local de construção da escultura.





"Estaleiro" quase montado...

Corte de Lastras


Corte de Lastras


Preparação das Barbotinas.




Do dia 1 ao dia 10 de Junho
Construção da escultura.


A base

O Victor, o Paulo, a Isabel e a Elisa no inicio da  "obra"


O Paulo e as primeiras lastras....

A Ana Filipe e a Isabel com o balde da barbotina....e boa disposição

As duas primeiras "filas" construídas e a "guias" montadas...

A Celeste, a Emília, o Victor, a Elisa e a Elisabete em acção...


Aos poucos a "árvore" vai crescendo...

...uns retoques dados pela Elisa...

No fim de cada "jornada" de trabalho foi necessário "proteger" a escultura para que não secasse demasiado...


Na Oficina do Solar fabricaram-se as lastras para a construção da peça.
Na foto o Victor o Luís, a Elisa, a Eugénia e a Isabel. Todos sempre atentos e colaborantes. 

A Eugénia e a Celeste transportando as lastras desde a oficina até ao local de construção da escultura.

Um "intervalo" para o lanche... Eu o Luís e o Victor a hidratar o corpo.
Sempre diligentes, a Eugénia a Emília e a Celeste nunca descuraram este importante aspecto do nosso Workshop.

E a "árvore" continua a crescer. Nesta foto pelas mão do Luís e do Victor.
A Emília e o Victor em acção.

Eu a Aurora Bargado e o Francisco Palma 

A meio "caminho"...

Dia 11 Junho
Construção da escultura.


Uma Quinta em Vale Figueira ofereceu-nos a lenha de eucalipto que precisávamos.
Primeiro dia de apanha de lenha.
Sem apoio para o transporte utilizámos os nossos carros...

A Celeste a Ana Filipe a Emília  e a Eugénia em plena recolha....





O André a encher o seu carro....




Dia 13 de Junho
Construção do último andar da escultura.

Início do processo de secagem da peça prejudicado pelas condições atmosféricas. (Fomos brindados com uma chuva forte durante quase todo o dia).




Victor ,Elisabete,Rosa,Celeste, Eugénia Emília e Elisa.

Elisabete,Rosa,Celeste, Eugénia Emília e Elisa e eu!

Forma final, falta o revestimento com o engobe que fabricámos...

Preparação do engobe de revestimento.

O Paulo, a Isabel, a Eugénia, a Emília, a Celeste, a Ana Cardoso, a Elisa e o André aplicaram o revestimento com o engobe fabricado.

A Eugénia "inspeccionando"....

O André atento aos pormenores....

A "árvore" revestida e pronta para a queima....


Dia 14 de Junho
Nova recolha de lenha que nos foi cedida gratuitamente por uma quinta em Vale Fetal.
Desta vez tivemos o apoio de uma viatura da Junta de Freguesia da Charneca da Caparica e do seu motorista Sr. Paulo.


Na foto, Elisabete, Eugénia, Isabel,o Paulo (motorista da viatura), eu, o Victor o Paulo e a Celeste. Grande equipa!

Reunida a lenha que usaremos na queima.



Dia 15 de Junho
Remoção dos andaimes e início da construção do forno.
Colocação da lenha dentro e fora da escultura.
Aplicação da rede de capoeira em volta da peça.
Protecção da escultura com lonas e plásticos devido à chuva que de vez em quando teimava em aparecer.



A Isabel, o Victor, Eu, a Ana Filipe, a Ana Cardoso, a Celeste,  a Eugénia, a Elisa, a Emília e o André em acção....

Aplicação de lenha no interior e preparação da boca do forno....



Ao fundo o Paulo preparava a madeira para revestir o forno....

A boca do forno feita... continuava a aplicação de troncos finos de eucalipto à volta da peça...

O Paulo, o Victor e eu iniciámos a colocação da rede de capoeira à volta da peça.

Rede bem justa e presa com arames.


Concentração e rigor....




A Ana Filipe a completar o enchimento dos espaços vazios com lenha....

Todos ajudaram... A Celeste sempre atenta!


Rede colocada. na parte superior construímos uma abertura para ser a futura  chaminé do forno....O Paulo muito concentrado neste trabalho de engenharia...



Dia 16 de Junho
Aplicação de 17 camadas de papel de revista cobertos de barbotina grossa sobre a rede para construir a parede interna do forno. 
Aplicação de uma cobertura de protecção sobre a escultura coberta com o papel revestido com barro para prevenir eventuais perturbações meteorológicas e permitir a secagem.



Iniciada a construção do forno de papel....
A Elisa a fazer a reportagem... A Ana Cardoso a "animar a malta"... e a Emília concentrada no revestimento das folhas de papel com barbotina... Eu em equilíbrio... instável! 


As "obreiras" do revestimento... Celeste, Eugénia e Ana Cardoso.

Como elas estavam atentas....


E o forno de papel quase pronto...
Eu, o Victor, A Celeste, a Emília e a Elisa...


Foto de conjunto com o forno quase feito....


O Carlos Sequeira, fotógrafo documentou com maestria estes momentos...

A Ana Cardoso sujou o telemóvel com a barbotina .... mas teve que o "atender"...

Barbotina, mãos e trinchas...

A  Ana Cardoso sempre bem disposta...
...A Eugénia atenta...
...Eu e o Victor de mão estendida à espera de material.... 

Balde, barbotina e colher....

Uns revestiam as folhas de papel com barbotina...
 ...outros aplicavam as folhas na parte superior do forno 
...os restantes nas parte inferior do forno... 
A "contabilidade" das camadas aplicadas  foi feita pela Ana Cardoso... 
Foram 17 Camadas ao todo...


Foto do Carlos Sequeira... para memória futura!


 Forno construído com três óculos laterais para fazer a medição da temperatura durante a queima.


Um dos óculos...




Dia 17 de Junho
Aplicação da manta refractária sobre o forno, apesar do revestimento não estar ainda completamente seco devido às condições do tempo que permanecia húmido.
Pelas 12 horas demos início ao aquecimento do forno.
Por volta das 15 horas com o forno aquecido a cerca de 200º C, iniciámos o processo da queima, lentamente. 
Por volta das 20 horas o forno atingiu os 600ºC.
A partir deste momento começámos a alimentar o forno com lenha num processo contínuo de modo a não permitir descidas de temperatura.
Às 23 horas atingimos os 900ºC.
Duas horas depois atingimos um pico de 1128ºC e decidimos continuar a alimentar a fornalha por mais meia hora mantendo a temperatura nos 1100ºC. Com algumas oscilações conseguimos o objectivo.
Da chaminé, então descoberta, com o forno a “plenos pulmões” saía uma chama esbranquiçada.
Deixámos de alimentar o forno por volta da 2 h altura em que a temperatura se mantinha nos 1100ºC.
Uma hora depois começámos a “acalmar” o forno tapando dois terços da chaminé, os óculos laterais e a boca da fornalha. Ainda conseguíamos ver a chama alaranjada resultante dos restos de lenha em combustão.
Por volta das 3 horas da manhã, com a chama já mais calma, tapámos a totalidade da chaminé. A partir desse momento já não havia chama visível e apenas víamos a incandescência da escultura através dos óculos laterais.
Pelas 4 horas do dia 18 de Junho deixámos o local do forno com este perfeitamente controlado na sua tarefa de redução natural da temperatura. Lá dentro ainda havia lenha e resíduos em combustão.


Com cuidado aplicámos a manta refractária...
Eu o Paulo e o Victor aplicámos a manta sob a supervisão a apoio da Celeste, Eugénia, Rosa, Emília, Elisa, Elisabete, Ana Filipe e Ana Cardoso. 





Fogueira acesa para fazer "brasas"...e iniciado o processo de queima....

Toda a gente em acção...

...e pose para a fotografia...

Preparados os "pirómetros"...
Inicio do registo das temperaturas.



Já fumega...




















FOGO Á PEÇA....




Dia 18 de Junho
Voltámos ao local da queima por volta das 9 horas da manhã.
Verificámos que nessa altura o forno ainda registava no seu interior a temperatura de 600ºC.


Dia 19 de Junho
Regressámos ao local da queima por volta das 10 horas da manhã.
Verificámos que nessa altura o forno ainda registava no seu interior a temperatura de 200ºC.
Tomámos então a decisão de tirar a tampa do forno e de destapar a boca da fornalha.
Espreitámos para o interior do forno e constatámos que aparentemente a peça não tinha danos estruturais visíveis. Relaxámos um pouco e decidimos marcar encontro para as 8 horas do dia seguinte, para “abrir” o forno.


Dia 20 de Junho
Encontro marcado para as 8 horas da manhã.
Curiosidade… Desmontado o forno verificámos que nas paredes inferiores da escultura existiam alguns danos que, não implicando problemas de estabilidade da mesma, seria preciso corrigir esteticamente. Tal aconteceu durante todo o resto do dia, ficando as correcções prontas cerca das 18 horas.

Aspecto do forno depois da queima e antes de ser desmanchado...


...antes da "grande abertura....
Elisabete, Rosa, Eu, Emília, Eugénia, Celeste, Ana Cardoso, André e a presença solidária e amiga do escultor, Jorge Pé Curto.



Dia 21 de Junho
Retoques finais, limpeza do local “ et voilá”…
Missão cumprida.



OBRA PRONTA!







Dia 25 de Junho
Pelas 9,30 horas foi solenemente inaugurada a escultura pelo Presidente da Câmara de Almada, na presença da maior parte dos executantes e de diversas entidades, como o Vereador da Cultura e a Presidente da Imargem. 




"Árvore"









(De cima para baixo e da esquerda para a direita)

Maria Rosa Alves, Mariana Alves, Victor Passos, Maria Elisa Leite, 
Elisabete de Sousa, Ana Cardoso, Ana Filipe, Maria Emília Oliveira, 
André Silva, Luís Filipe Tavares, Paulo Sousa, Maria Celeste Sambrana, 
Isabel Lamelas,  Maria Eugénia Botelho, e Júlia Quaresma.


Palavras ditas!

Quando sonhei realizar um trabalho com estas características estava longe de imaginar que algum dia o pudesse concretizar. E eis que hoje finalmente acordo do sonho e confrontado com a realidade, chego à conclusão de que vale sempre a pena lutar por aquilo que gostamos, cremos e acreditamos.

Encontrei no meu caminho a Imargem, e os companheiros da direcção, que mal abri a boca para falar deste projecto, o tornaram seu. À Imargem, associação dos artistas plásticos de Almada, a que me orgulho de pertencer, os meus agradecimentos.

Depois apresentámos a ideia à apreciação do Departamento de Cultura da CMA, que apesar da “loucura subjacente” a este projecto, resolveu com um espirito de total abertura e cooperação apoiar a sua realização demonstrando assim que para a CMA as artes plásticas são parte integrante do seu Projecto Cultural.

Por fim e não menos importante quero agradecer a todos os participantes no workshop que realizou o projecto “arvore”. Foi um grupo de mulheres e homens excepcionais, que sempre contribuíram com o seu trabalho e entusiasmo para que tudo isto se concretizasse. Para todos o meu abraço de reconhecimento.

Este projecto é pioneiro em Portugal! É bom que se saiba.
Realizaram-se projectos desta natureza um pouco por todo o Mundo. Em Portugal também se realizou um (apenas um), em Montemor-o-Novo, pela mão e orientação de uma artista dinamarquesa mas este foi o único a ter sucesso até agora. E logo havia de ser aqui. Em Almada, cidade onde a sei que a Educação e a Cultura são preocupações de primeira linha e que espero que assim continue, porque a Educação e a Cultura são o adubo que permite que as populações cresçam e evoluam livremente.

Esta escultura foi inteiramente construída com uma pasta de cerâmica refractária, aqui neste local, e aqui queimada com lenha, numa fogueira controlada que nos permitiu ter um pico de temperatura na ordem do 1.128º C comprovado pelos pirómetros eletrónicos utilizados.
A nossa “árvore” aqui está.
Para todos nós e também para as pequenas aves que nela queiram habitar… e também para que o Solar dos Zagallos a possa aproveitar para promover, junto das crianças do nosso Concelho, o respeito pelas obras de arte pública e pelo ambiente e também despertar o interesse pela cerâmica contemporânea.

Esperamos que o espaço em volta desta escultura tenha um pequeno arranjo, disponibilizando-nos para contribuir com a nossa opinião e através do diálogo necessário nestes casos.
Solar dos Zagallos
Sobreda da Caparica
25 De Junho de 2016

José António Silva












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